Primeiro dia do Seminário Internacional sobre sistemas universais de saúde começa com debate sobre a felicidade e o crescimento econômico e social

Filomeno Fortes, James Fitzgerald, Fábio Baccheretti, Hisham Hamida e Arthur Chioro na abertura do seminário internacional Os Desafios da Sustentabilidade dos Sistemas Universais de Saúde nas Américas

Como ser feliz em meio a um cenário de tantas transformações econômicas, sociais, demográficas e climáticas que afetam cada vez mais o meio ambiente e tudo o que nele habita? É possível compatibilizar crescimento econômico, meio-ambiente, desenvolvimento humano, inovação e sustentabilidade visando a felicidade?
Para o ex-ministro da educação, Cristóvam Buarque, é possível. No entanto, segundo ele, um longo caminho precisa ser percorrido e passa por uma boa educação e pela vontade política de priorizar o que de fato é importante para o crescimento de um país.

A afirmação do ex-ministro aconteceu na conferência magna que abriu o seminário internacional O Desafio da Sustentabilidade dos Sistemas Universais de Saúde nas Américas, realizado pelo Conass, com o apoio da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS), nesta terça-feira, em Brasília.
O evento reuniu especialistas de países da América Latina e de autoridades do Brasil, para discutir estratégias que possibilitem aos sistemas de saúde vencerem os desafios impostos pelas transformações que assolam o mundo, levando em consideração as experiências de outros países e do próprio Brasil, acerca de questões relevantes que vão desde a capacidade de resposta às emergências sanitárias, à participação social, à força de trabalho e do financiamento, à governança, à regionalização e às redes de atenção à saúde. 

A partir de uma reflexão sobre a busca pela felicidade, Cristóvam Buarque, que já foi governador do Distrito Federal, falou sobre as condicionantes que determinam a capacidade de uma pessoa ser feliz . “O caminho nessa busca é feito pela sociedade, por meio dos governos, mas para caminhar precisamos de um mapa que só a educação pode nos dar”, disse, fazendo uma analogia e chamando a atenção para a importância de um sistema educacional eficiente.

Cristóvam Buarque durante Conferência Magna do seminário internacional O Desafio da Sustentabilidade dos Sistemas Universais de Saúde

Para Buarque, com a educação que o Brasil oferece atualmente, é impossível garantir a sustentabilidade do sistema de saúde, pois não haverá profissionais capazes de contabilizar crescimento econômico, inovação e desenvolvimento, pilares fundamentais para a solidez de um sistema público de saúde .“Se cuidarmos da educação, evitaremos o sofrimento por causa da pobreza e vamos evitar essa amarra que o Brasil sofre e que não consegue sair que consiste na baixa renda e na concentração de renda nas mãos de poucas pessoas. Para termos um país onde cada um tenha a mesma chance de buscar a sua felicidade, precisamos cuidar da educação de base. O Brasil tem o recurso, falta uma vontade nacional para isso”, concluiu Buarque.

Na abertura do encontro, Fábio Baccheretti Vitor, presidente do Conass, citou a experiência do Brasil durante a pandemia de Covid-19 e disse que ela é a prova de que o Sistema Único de Saúde (SUS) é, de fato, um exemplo para o mundo. Para ele, o  seminário irá proporcionar que outros países aproveitem a experiência do Brasil em vários aspectos. “A pandemia mostrou que temos um jeito especial de trabalhar e provou que, mesmo com os vários problemas que enfrentamos, como o subfinanciamento, por exemplo, ainda assim, a nossa eficiência é inegável”, afirmou.

Fábio também citou outros pontos fortes do SUS que poderão ser inspiradores para os sistemas de saúde de países da América Latina, mas também ponderou que o Brasil tem muito a aprender com a experiência de outras nações. “Teremos dois dias de debates muito ricos que com certeza nos deixarão mais preparados e resilientes para enfrentar os desafios e situações que colocam em risco a sustentabilidade dos nossos sistemas”, concluiu. 

Outras autoridades estiveram presentes na abertura do seminário, como o presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Hisham Hamida, o secretário adjunto de Atenção Especializada do Ministério da Saúde, Nilton Pereira Junior, o presidente da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), Arthur Chioro, o diretor de Sistemas e Serviços de Saúde da Opas/OMS, James Fitzgerald, e o diretor do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa, 

Todos eles apontaram desafios comuns relativos à resiliência dos sistemas universais de saúde e apontaram que este é, talvez, um dos maiores desafios da agenda sanitária dos países que possuem esse tipo de sistema. Para eles, a troca de experiências que acontecerão nos dois dias do evento, será fundamental para subsidiar o debate estratégico das autoridades sanitárias. 

James Fitzgerald, Nilton Pereira, Lucilene Florêncio de Queiroz e Luis Alberto Martinez Saldarriaga

Os Sistemas Nacionais de Saúde e o Desafio da Universalidade, Integralidade, Equidade e Articulação: Um Panorama dos Países

Para debater os desafios e dos sistemas de saúde, suas performances, equidade, articulações e novos avanços, a moderadora da mesa “Os Sistemas Nacionais de Saúde e o Desafio da Universalidade, Integralidade, Equidade e Articulação: Um Panorama dos Países”, Lucilene Florêncio (SES/DF), falou sobre a importância de entender o que vem acontecendo nas Américas. “Para que possamos aprimorar o SUS e consigamos avançar cada vez mais, é fundamental trocar experiências com outros países”, destacou.

Durante o debate, o secretário adjunto da Secretaria de Atenção Especializada Saúde, Nilton Pereira, que foi representando a ministra Nísia Trindade, apresentou os desafios e avanços do Ministério da Saúde. Nilton contou que no início do governo, além dos desafios estruturais que o ministério enfrentou, o maior deles foi o movimento antivacina que aconteceu no Brasil, fazendo com que a cobertura vacinal diminuísse em todo País. “O SUS é o maior comprador de vacinas do mundo, mas apesar de melhorar a cobertura, ainda enfrentamos o desafio da desinformação das vacinas”, contou. Nilton também falou do aumento da cobertura do Mais Médicos, que vem crescendo, alcançado um número maior de médicos nos municípios com maior vulnerabilidade. 

Karina Rando, ministra da Saúde Pública do Uruguai, contou que o sistema de saúde do Uruguai teve uma evolução nos últimos 15 anos, graças à reformulação da constituição, favorecendo as pessoas mais vulneráveis. Ela disse sobre os diferentes cuidados que a população necessita por questão regional. “No Uruguai, tem a questão de localidade, que precisam de cuidados diferentes e atenção diferentes. Precisamos que os recursos sejam alocados para todas as pessoas, mas isso hoje ainda não é possível para todas as áreas da saúde, para que atenda todas as regiões”, falou. Além disso, Karina comentou que no Uruguai tem características importantes que se limitam à grande extensão da qualidade de serviço que tem, mesmo com a abrangência pequena.

Luis Alberto Martínez Saldarriaga, vice-ministro da Proteção Social Colômbia, enfatizou que a saúde vive um processo por causa dos antecedentes, das desigualdades e falta de financiamento na saúde. “Precisamos reforçar a governança para a gestão do sistema de saúde de base territorial em coordenação com a Rede Integral e Integrada Territorial de Saúde, fortalecer a liderança e as autoridades de saúde nos níveis nacional e fortalecer o departamento dos serviços de saúde e inovação nos hospitais”, disse. 

Para James Fitzgerald, diretor de Sistemas e Serviços de Saúde da Organização Pan-Americana da Saúde em Wasghinton, debatedor da mesa, existem desafios comuns aos sistemas de saúde dos países das Américas que impedem uma saúde de qualidade para as pessoas. “O pilar mais forte para garantir acesso a todos com qualidade é o financiamento e as desigualdades sociais em diferentes territórios no mesmo país, essas são as maiores dificuldades”, ponderou. Outro ponto importante levantado por ele foi a pandemia. Para ele, esses países mostram que a sociedade não estava preparada para agir em conjunto em casos de emergências sanitárias.

A importância da regionalização e a conformação das Redes de Atenção à Saúde baseadas em Atenção Primária à Saúde

Ernesto Bascolo, Juan Pablo Rubio, Tânia Mara Coelho e Nicolas Kreplak

Para debater a importância da regionalização e a conformação das Redes de Atenção à Saúde baseadas em Atenção Primária à Saúde, em especial em regiões de difícil acesso, as estratégias do Ministério da Saúde foram destacadas pelo secretário de Atenção Especializada à Saúde do Ministério da Saúde, Adriano Massuda. “Queremos mostrar a todos que estamos trabalhando para que a Atenção Especializada vai funcionar cada vez melhor. Queremos diagnósticos no tempo certo, assim os tratamentos serão feitos no tempo adequado”, disse.

Massuda contou que o debate é fundamental para organizar a atenção especializada. Além disso, ele pontuou que o desafio da Atenção Especializada é mundial mesmo em países bem estruturados. “Essas questões foram agravadas na pandemia, no Brasil esses desafios são maiores por causa das desigualdades sociais e das questões regionais”, contou.

Nicolás Kreplak, ministro da Saúde da província de Buenos Aires, fez um comparativo com o Brasil, que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, garantida através de políticas sociais e econômicas. Já na Argentina, as províncias (estados) são constitucionalmente responsáveis ​​pela garantia do direito à saúde, com variações consideráveis ​​nas suas capacidades de gestão e financiamento. “Como temos a ausência de um artigo constitucional que garanta diretamente o direito à saúde, temos um aumento de desigualdades na garantia deste direito entre províncias, uma alocação desigual de recursos para o sistema de saúde em cada província e a falta de governança”, disse.

Já o Juan Pablo Rubio Schweizer, médico da família da Comissão de reforma do Ministério da Saúde do Chile, destacou que a reforma da saúde no Chile tenta responder aos desafios da saúde. “O maior desafio é a mudança no modelo assistencial. Com um aumento médio de 12,5% no financiamento dos municípios, resultados importantes foram alcançados”, comentou.

Ernesto Bascolo, chefe da Unidade de Atenção Primária da Saúde e Prestação de Serviços Integrados da Organização Pan-Americana da Saúde em Wasghinton, concluiu que mesmo com as evoluções dos países, muitas coisas necessitam de um melhor financiamento para saúde, principalmente no Brasil.

Preparação e resposta para futuras emergências

Rodrigo Frutuoso, Luic Boiuleou, Rasível dos Reis, Fabio Baccheretti e Edgar Rolando González Barreno

O debate sobre a capacidade de resposta dos sistemas de saúde às emergências sanitárias encerrou as discussões do primeiro dia do Seminário. No painel, coordenado pelo secretário estadual de Saúde de Goiás, Rasível dos Reis, foram apresentadas as experiências do Brasil, da Guatemala e da província de Quebec/Canadá, com a pandemia da Covid-19. 

Fábio Baccheretti, presidente do Conass e secretário estadual de Saúde de Minas Gerais, mostrou as ações de enfrentamento da Covid-19 realizadas no estado e disse que elas espelham boa parte do que aconteceu no Brasil. O secretário citou os pilares que foram base do planejamento das ações de combate à doença: utilização de dados confiáveis, a expansão de leitos, o apoio operacional e o fornecimento de medicamentos e de oxigênio.
Ele também deu destaque ao Painel Conass Covid-19 que, segundo observou, foi a principal ferramenta para os gestores terem ciência do cenário real da doença e assim, tomarem as suas decisões com base em dados seguros.

Para o presidente do Conass, a pandemia escancarou a necessidade de pensar em estruturas físicas que sejam complacentes com novos momentos de emergências, além de pensar em estratégias que tornem o País mais independente do ponto de vista do complexo industrial da saúde, da fabricação de insumos e de vacinas e com uma rede que se conecte de maneira mais ágil. 

Já a experiência da Guatemala foi apresentada pelo vice-ministro de Regulação, Vigilância e Controle da Saúde, Edgar Rolando González Barreno, que fez uma breve contextualização sobre a crise estrutural histórica do sistema de saúde do país. A existência do narcotráfico, a pobreza, as desigualdades sociais e a violência, afetam, segundo o vice-ministro, a institucionalidade do sistema de saúde e esta crise histórica foi um fator predominante para a pouca resposta à pandemia. 

Segundo ele, a pandemia acentuou a fragilidade do sistema de vigilância, o surgimento de grande número de pessoas com doenças crônicas não controladas e a falta de equipamentos de proteção individual para os profissionais de saúde.

No Quebec, província canadense com uma população de 9 milhões de habitantes, Luic Boileau, diretor Nacional de Saúde Pública, explicou que o governo é inteiramente responsável pela organização e oferta de serviços, incluindo os de saúde pública. Lá, o acesso ao serviço é universal e não há sistema privado, sendo mais da metade do orçamento da província destinado à saúde pública e ao serviço social.

Ainda assim, de acordo com Boileau, o sistema foi posto à prova com a pandemia, devido a uma série de fatores. “ Quando a Covid chegou não imaginávamos que estávamos tão fragilizados para enfrentá-la. Não tínhamos equipamentos hospitalares suficientes, como respiradores, oxigênio, equipamentos de proteção individual para os enfermeiros”, disse. 

No entanto, a liderança governamental forte, com a presença das autoridades sanitárias nos meios de comunicação, explicando os riscos, as políticas públicas e as regras de uma gestão de crise sanitária, foi um fator de sucesso no enfrentamento da pandemia, explicou o diretor que citou ainda, que houve também uma forte mobilização de todas as equipes de saúde pública no enfrentamento da doença. “No início foi difícil porque estávamos diante de algo novo e muitas vezes tomamos atitudes que, posteriormente, vimos não serem necessárias, mas conseguimos nos adaptar e fazer uma comunicação eficiente”, concluiu.

Sobre este ponto, Rodrigo Frutuoso, consultor da Opas/OMS, foi enfático ao afirmar que não se inicia e não se termina um evento de emergência com as mesmas ações e mesmos atos, por isso é importante a utilização de plataformas científicas que pautem as decisões dos gestores.

Rodrigo também chamou a atenção para o envolvimento de outros setores na preparação e enfrentamento da pandemia. “A saúde é um assunto de todos e a preparação para estes eventos se estende também a cada parcela da sociedade que tem uma atribuição e uma competência que precisam ser incorporadas a esses planos de enfrentamento a eventos pandêmicos”, destacou.

Rasível dos Reis, coordenador do painel, destacou que o debate abordou muitos pontos que precisam ser considerados, como a necessidade da expansão dos serviços de saúde, a gestão baseada em dados e a definição de um padrão de integralidade. “Se a gente não tivesse aprendido nada com uma crise como essa, estaríamos desvalorizando todo o sofrimento e mortes que aconteceram. Esses aprendizados precisam ser perenizados para termos uma estrutura adequada para futuras situações de emergência”, finalizou.

O Seminário continua com debates sobre governança, força de trabalho e financiamento.

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Assista, na íntegra:

Assessoria de Comunicação do Conass