Assunto: Edital de chamamento público nº 3/2022 do Ministério da Cidadania, visando a seleção de organização da sociedade civil que preste atendimento como Hospital Psiquiátrico.
O Ministério da Cidadania, por meio da Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas – SENAPRED, publicou edital de chamamento público para a seleção de até 33 propostas de Hospitais Psiquiátricos na modalidade de internação, hospital-dia, ambulatório ou pronto atendimento, interessados em celebrar termo de colaboração que tenha por objeto a execução de projetos de cuidado, tratamento e/ou reinserção social de pessoas com problemas decorrentes do uso prejudicial e abusivo de substâncias psicoativas, em ambiente hospitalar.
Ressaltamos que os instrumentos de gestão do Sistema Único de Saúde – SUS, são construídos dentro da lógica de organização das Redes de Atenção à Saúde em seus territórios, sendo os gestores de saúde os responsáveis sanitários pela organização e perenização do sistema. É o gestor de saúde que assume a responsabilidade ética, política, técnica e administrativa pelo cuidado em saúde nos equipamentos e serviços em seus territórios.
O edital de chamamento citado representa interferência nas instâncias de governança e pactuação do SUS, previstas em lei, com eventual financiamento de hospitais psiquiátricos sem a devida interlocução com a rede de atenção à saúde na qual estão inseridos, sem adentrar nas discussões que referem adequação orçamentária e financeira para despesas de custeio e investimento.
Ações e serviços de saúde mental – para usuários do SUS – são ofertados segundo a lógica dos territórios – dentro da compreensão de que o território é o espaço vivo de interação e troca do usuário – cujo modelo visa a promover cuidado integral com vistas à reabilitação em saúde e a reinserção social desses pacientes. Os serviços de base comunitária têm justamente essa finalidade, de aproximar as ofertas de serviços em saúde às necessidades dos usuários do sistema garantindo um cuidado que não viole seus direitos ou promova o estigma dessas pessoas.
Enfatizamos que do ponto de vista terapêutico, os hospitais psiquiátricos não são considerados os ambientes mais adequados para o cuidado e reabilitação de usuários que fazem uso prejudicial e abusivo de álcool e outras drogas, portanto, edital que busca financiar hospitais psiquiátricos para a oferta desse tipo de assistência revela-se violação à Política Nacional de Saúde Mental, além de desrespeito à organização de base comunitária e as respectivas redes de atenção.
Os CAPS AD têm instrumentos para realizar intervenções clínicas e psicossociais dentro da lógica de organização dos serviços no território, com médicos clínicos, psiquiatras, enfermeiros e equipe multiprofissional, atuando nos projetos terapêuticos desses pacientes, e somente em caso de necessidade, são encaminhados para os leitos psiquiátricos nas unidades de referência em Hospital Geral.
Tal modelo guarda compatibilidade com a lei nº 10.216 de 2001, que redireciona o modelo assistencial em Saúde Mental e define as diretrizes de proteção dos direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, o que denota à tal edital, por não enfrentar os debates no âmbito do SUS, um movimento que visa criar e financiar dispositivos que são incompatíveis com os ditames legais e toda a seara da saúde.
Por tais motivos, CONASS e o CONASEMS entendem pelo cancelamento do referido edital e reafirmam que as discussões sobre a saúde mental devem seguir o rito das instâncias técnicas e políticas do SUS.
Brasília, 11 de abril de 2022.
Nésio Fernandes de Medeiros Junior
Presidente do CONASS
Wilames Freire Bezerra
Presidente do CONASEMS
—