Antes mesmo da criação do Sistema Único de Saúde (SUS), respondendo ao desejo dos secretários estaduais de saúde em atenderem às recomendações da Conferência de Alma-Ata, realizada em 1978, e liderados pelo médico reconhecido internacionalmente e então secretário de Saúde do Estado de São Paulo, Adib Jatene, foi criado o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), em 3 de fevereiro de 1982. Hoje completam-se, portanto, 40 anos de sua criação, em meio ao maior dos desafios já enfrentados na história do SUS: a grave pandemia de Covid-19.
“Em 1979, os secretários assumiram em um momento em que o país estava saindo do regime militar e caminhando para o sistema democrático. Havia aí grande entusiasmo de participação popular, mas, um ano antes, ocorreu Alma-Ata e de lá se retirou o slogan Saúde para todos no ano 2000. Os secretários estaduais da época voltaram sua atenção para fazer a cobertura de toda a população, mas em nível estadual não estavam conseguindo apoio de seus governadores para montar a infraestrutura necessária. (…) então em uma reunião que tivemos em Curitiba, com a participação de alguns secretários muito participativos, sugeriu-se que nós criássemos um Conselho Nacional dos Secretários de Saúde e meu nome foi sugerido para ser o presidente. Foi nesse contexto que nasceu o Conass”, destaca Adib Jatene em trecho da entrevista concedida ao Conass, por ocasião da comemoração dos 25 anos da instituição.
Ao reconstruir a trajetória histórica do Conselho, ela se confunde e se entrelaça com a história do próprio SUS. E não poderia ser diferente. Falar do Conass é falar do SUS. Não é possível falar do SUS sem falar do Conass, do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), do Ministério da Saúde e do Conselho Nacional da Saúde (CNS).
Criado com o objetivo de fortalecer as secretarias estaduais de saúde, torná-las mais participativas na reconstrução do setor saúde e representá-las politicamente, o Conass, em sua trajetória na saúde pública brasileira, participou e participa diretamente da discussão, criação e implementação das políticas públicas de saúde.
Em quatro décadas de existência, testemunhou o nascimento do SUS e alavancou progressos importantes para a saúde pública brasileira, seja por meio de seus programas e projetos, seja pela sua atuação incisiva nos fatos marcantes para a mudança do cenário do setor saúde – como a participação ativa na VIII Conferência Nacional de Saúde, que foi fundamental para a institucionalização do direito à saúde para todos os cidadãos brasileiros e que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988 – seja, ainda, no enfrentamento das duas atuais crises sanitárias: a do vírus e a da ignorância.
CONSOLIDAÇÃO DO CONASS
Apenas em 1990 o SUS foi regulamentado com a publicação da Lei n. 8.080/1990, a chamada Lei Orgânica da Saúde. Foi também naquela década que o Conass consolidou-se como representante da gestão estadual do SUS, uma vez que, com a criação da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), em 1991, passou a representar formalmente o pensamento dos secretários estaduais de saúde no fórum destinado à tomada de decisão em conjunto com União e municípios, colocando em prática a descentralização político-administrativa do SUS, prevista na referida lei, e formalizando assim o seu primeiro eixo de atuação: o da representação política dos secretários.
Nesse período, o Conass participou ativamente e de maneira fundamental na formulação das Normas Operacionais Básicas (NOBs) n. 91, 93 e 96.
Já nos anos 2000, sua participação crescia e marcava acontecimentos importantes como a publicação das Normas Operacionais da Assistência à Saúde n. 01 e 02 (NOAS); o Pacto pela Saúde em 2006, que atendeu a uma reivindicação antiga do Conselho pela revisão do processo administrativo do SUS; a institucionalização do Conass em 2011, com a publicação da Lei n. 12.446, que reconheceu legalmente o Conselho como entidade representativa dos entes estaduais nas instâncias do SUS, para tratar de matérias referentes à saúde; a luta pela regulamentação da Emenda Constitucional n. 29; o Movimento Nacional em Defesa da Saúde Pública – Saúde +10 – que tentou assegurar o repasse efetivo e integral de 10% da Receita Corrente Bruta da União para a saúde pública brasileira e, mais recentemente, a luta contra a Emenda Constitucional nº 95, que congelou gastos sociais por 20 anos.
APOIO TÉCNICO
Paralelamente aos principais acontecimentos do SUS, o Conass começava a desenvolver outro importante eixo de atuação: o do apoio técnico aos secretários estaduais de saúde e às suas equipes técnicas. Percebeu-se a necessidade de fortalecer o corpo técnico da instituição, a fim de respaldar as decisões políticas de seus membros. Em 1996, criou-se a Câmara Técnica (CT) de Planejamento do Conass. A partir do sucesso dessa CT e do crescimento de demandas por apoio nas mais diversas áreas, surgiram então novas câmaras técnicas, que totalizam 13 eixos temáticos: Atenção à Saúde; Atenção Primária à Saúde; Assistência Farmacêutica; Comunicação em Saúde; Direito Sanitário; Epidemiologia; Vigilância em Saúde Ambiental; Gestão e Financiamento; Saúde do Trabalhador; Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde; Informação e Informática em Saúde; Vigilância Sanitária; Qualidade no Cuidado e Segurança do Paciente.
Seja por meio de publicações com conteúdos que subsidiem os gestores estaduais e suas equipes com informações técnicas e gerenciais do SUS, seja por meio de assessoria direta às secretarias ou por programas de capacitação, o Conass, ao longo desses 40 anos, tem investido e se aprofundado em seu planejamento estratégico, a fim de contemplar os temas mais importantes, apontados pelos secretários estaduais de saúde.
PRODUÇÃO E DISSEMINAÇÃO BIBLIOGRÁFICA
Em 40 anos de existência, uma das características mais marcantes da Conass é a sua vasta gama de publicações. Elas se compõem de coleções com informações técnicas; cadernos documentais ou relatórios, reunidos na Biblioteca Digital do Conass, que oferece regularmente aos gestores do SUS, suas equipes técnicas e demais profissionais de saúde, vasto material de leitura, sempre abordando as principais mudanças que ocorrem na gestão do SUS a fim de oferecer informações atualizadas sobre os principais temas que permeiam o universo da saúde pública. Com isso, criou-se mais um eixo de atuação: o da gestão e divulgação do conhecimento.
As publicações do Conass, além de impressas, estão disponíveis também em meio digital, podendo ser baixadas gratuitamente no computador, tablet ou smartphone!
RELAÇÕES INTERNACIONAIS
A fim de promover o debate com outros países sobre os êxitos alcançados pelo SUS e também intercambiar experiências sobre sistemas universais de saúde e compartilhar estratégias para sua defesa e aprimoramento permanentes, o Conass mantém diversas parcerias internacionais.
Entre os parceiros internacionais destacam-se a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS); a Universidade de Montreal (Canadá); o MInistério da Saúde e Serviços Sociais do Québec (Canadá); a Escola Nacional de Administração Pública do Québec (Canadá); a Conferência Luso-Francófona da Saúde (Colufras); o Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa (IHMT); a Universidade de Toronto (Canadá) e a Associação Latina de Análise dos Sistemas de Saúde (ALASS).
O Conass integra e coordena a Comissão Temática da Saúde e Segurança Alimentar e Nutricional dos Observadores Consultivos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e participa do Observatório Ibero-Americano de políticas e sistemas de saúde. Além disso, participa do Fórum da Sociedade Civil dos Países de Língua Portuguesa.
ATUAÇÃO NA PANDEMIA
No começo de 2020, o vírus da Covid-19 começou a infectar pessoas em países da Ásia e da Europa. Ainda antes de chegar no Brasil, o Conass alertou sobre a necessidade da preparação da rede assistencial do SUS para enfrentar a iminente pressão sobre os leitos de UTI, medicamentos para intubação e, especialmente, sobre os profissionais da saúde.
O SUS mostrou o seu valor ao atender e cuidar de milhões de infectados. Ainda antes da vacina, vimos, com alegria e esperança, pessoas que enfrentaram longos períodos de tratamentos em unidades de terapia intensiva e superaram a infecção. Houve muitos momentos de harmonia entre as três esferas de gestão do SUS e atuação em conjunto, buscando financiamento adequado e enfrentando a feroz concorrência mundial para a aquisição de insumos hospitalares. Foi demonstrada que a lógica da gestão tripartite é acertada e a descentralização é uma conquista dos brasileiros.
Profissionais de saúde, nossos heróis nacionais, não pouparam esforços e sacrificaram até a própria vida para salvar os infectados, independente da nacionalidade ou cidade de origem do paciente. Gestores e técnicos da saúde trabalharam intensamente para garantir que o direito à saúde fosse uma realidade.
Isso é o SUS! Uma política pública que salva vidas e mostra o seu valor!
Entretanto, observamos com tristeza que, em muitos momentos, houve falta de união e de foco no enfrentamento do nosso único inimigo: a Covid-19. Ainda no começo do enfrentamento da pandemia, gestores estaduais perceberam que os desafios no Brasil seriam agravados pela ausência de uma coordenação clara e objetiva da gestão federal. Ações tardias, compromissos não atendidos e a ausência do direcionamento nacional somaram-se à doutrinação do negacionismo e do obscurantismo. O Conass lutou, e ainda luta contra o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes para o tratamento da Covid-19. Além da falta de testes; equipamentos para abertura de leitos de UTI; medicamentos para intubação e orientações coordenadas, o Brasil e o mundo ficaram perplexos com a decisão do Ministério da Saúde em esconder os dados de casos e óbitos diários em decorrência da Covid-19.
Nesse contexto, o Conass não ignorou os princípios constitucionais do SUS e intensificou sua atuação junto às SES e à sociedade. Assumiu os vácuos criados pela ausência da coordenação federal e lançou notas técnicas, informativas e notas à imprensa e, em parceria com o Conasems, foram publicadas matrizes de gestão de risco e um guia orientador para o enfrentamento da pandemia na Rede de Atenção à Saúde. Conass e Conasems assumiram a responsabilidade de consolidar os dados de estoque e consumo de medicamentos usados na intubação e de apoiar estados e municípios no remanejamento dos estoques existentes e apresentar a situação ao Ministério da Saúde que, tardiamente, criou grupo de trabalho para monitorar a situação e realizar compras nacionais.
Outro fato marcante foi o lançamento do Painel Covid-19, que em menos de 48 horas foi desenvolvido e publicado com o consolidado dos dados da pandemia nos estados. Há mais de 600 dias ininterruptos, o Conass divulga diariamente os dados fornecidos pelas SES, sempre às 18h. O painel é referência para os principais veículos de comunicação no Brasil e no mundo e contabiliza mais de 26 milhões de visualizações de usuários oriundos de 194 países.
À luz da ciência, o Conass alertou o Brasil sobre a necessidade do esforço nacional para garantir vacinas contra a Covid-19 com rapidez, eficiência e segurança. Defendeu a pesquisa nacional para que tenhamos produção nacional de vacinas. Lutou, em conjunto com o Conasems, para a incorporação ao Programa Nacional de Imunizações (PNI) de todas as vacinas contra a Covid-19 aprovadas pela Anvisa. Planejou, com os demais entes gestores, a operacionalização da campanha nacional de vacinação, com características inéditas na história do SUS, pela complexidade em identificar individualmente os vacinados e pela escassez mundial de doses. Foi contra a tentativa de ataque a um dos pilares do SUS: a universalidade.
Após o início da vacinação contra a Covid-19, o Brasil continuou perplexo com a falta de uma ampla e constante campanha de comunicação para incentivar a vacinação, além de atos de desestímulo e descrédito à vacina. Lutou pela continuidade da vacinação em adolescentes. Destacou a importância da estratégia de exigência do certificado vacinal. Mais recentemente, defendeu a vacinação em crianças e manifestou apoio à Anvisa, especialmente pelas injustas agressões sofridas nos últimos meses.
Hoje, o Conass faz 40 anos de luta em favor da saúde pública brasileira e dos princípios constitucionais do SUS. A sociedade brasileira percebeu a força do SUS e a importância desta que é a maior política de inclusão social do Brasil. O Conass reforça seu compromisso na garantia do direito à saúde!
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Ascom Conass
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(61) 3222-3000